20 janeiro 2007

O grande simulador


O mundo começou sem o homem
e acabará sem ele.
Claude Lévi-Strauss (1908 - )

Nada nos garante, antes pelo contrário, que a nossa espécie permanecerá. Como tudo o resto transportamos progresso e ruína e não somos, antropologicamente, quem fomos nem aquilo que seremos. Não podemos saber exactamente o que mudou na nossa estrutura biológica nos últimos cem anos, porém temos por certo que algo mudou, ou de outro modo todas as ciências humanas estariam erradas.
Também os nossos “estados de alma” se transformarão como tem acontecido sempre até aqui. Os dramas que nos comovem ou exasperam, e que se aproximam por estes dias mais da representação que da realidade, quiçá perderão relevância à força do desengano, na constante repetição encenada… Livramo-nos constantemente do estorvo da indigência e da desmoralização apenas com uma finta de corpo no passo apressado para o sucesso que urge. Num próximo futuro porventura deter-nos-emos, não por egocêntrica piedade, mas para cismar nas causas de tal revés, onde nos incluiremos.
Conta-se que no século XV os nossos ilustres antepassados rapavam as barbas, que usavam fartas em sinal de distinção, quando se sentiam cair em desonra. É provável que o tempo aniquile o conceito da mesma forma que ridicularizou o gesto.
Da crueldade física ao desprezo intelectual muito se caminhou. Mas eis o prodígio individual, veio para vencer, não importa que jogo, não importa a que preço, o que lhe interessa é ganhar! Talvez que esteja já aí o maior simulador de sempre, que ganhou todos os jogos de simulação e que transformará o mundo num simulacro ideal!

Cátia Farias

6 comments:

Anonymous Anónimo said...

Tudo evolue em suceção,em varias etapas dirigindo-se á entropia,á imperfeição.
E se nós formos apenas uma projecção?Uma méra ilusão de sentidos vivendo recolhidos em nós proprios?

.

21/1/07 3:05 da manhã  
Blogger Caiê said...

Concordo em absoluto com a afirmação de Lévi-Strauss e penso nela incontáveis vezes... A questão está em saber quanto tempo, quanto isso demorará... ;)

22/1/07 7:09 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

O grande mistério de tudo isto é saber se antes de nos suicidarmos enquanto seres e civilização não deixaremos outros seres no nosso lugar, talvez involuntariamente e à revelia, mas ainda assim inevitavelmente, ou serem esses mesmos seres a traçarem o nosso calvário de extinção...

23/1/07 12:06 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

«Conta-se que no século XV os nossos ilustres antepassados rapavam as barbas, que usavam fartas em sinal de distinção, quando se sentiam cair em desonra. É provável que o tempo aniquile o conceito da mesma forma que ridicularizou o gesto.»

Se há aspectos do comportamento humano e das atitudes ético-morais actuais que, de forma subjectiva e segunda o meu qudro valorativo, consigo "sentenciar" de evoluções civilizacionais (a titulo de exemplo: olhamos para as batalhas antigas como bárbaras e classificamos os seus intervenientes como bárbaros num tom de censura e com o sentimento de estarmos uns degraus acima na civilização. Porém, considero que actualmente, e no que se refere a guerras, não temos razões para nos colocarmos num pedestal civilizacional, e só temos que cobrir a cara de vergonha pela barbaridade de incluirmos as mulheres e as crianças na guerra, de destruirmos vidas com o clicar de um botão, etc, etc. Como nos classificariam os, por nós considerados,"bárbaros" se vivessem no mundo actual?), outras há que escapam à minha "fúria" de classificação.

E isto levanta algumas questões:

Se relativamente aos "estados de alma" a palavra "transformação" é, possivelmente, a mais correcta, será que no que se refere à ética e aos costumes podemos falar em "evolução" ou "retrocesso"? Ou devemos, com rigor, deter-nos apenas nas palavras "mudança" e "transformação"? E mais, será possivel fazer a classificação de determinadas atitudes como retrogradas ou evoluidas, sem contaminarmos a análise com o padrão ético pessoal e actual? E o homem, no seu conjunto de atitudes éticas e comportamentais terá evoluido, retrocedido ou mudado apenas?

29/1/07 8:25 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Pequena correcção

onde se lê:
«consigo "sentenciar" de evoluções civilizacionais (a titulo de exemplo:...»

ler
«consigo "sentenciar" de retrocessos civilizacionais (a titulo de exemplo:»

29/1/07 8:29 da tarde  
Blogger antimater said...

Gisela,

Em rigor não podemos falar de “avanço” ou “retrocesso” já que estamos inseridos no processo o que não permite juízo neutral.
“Transformação” parece ser a única evidência neste caso…
Depois, quantas vezes os “avanços” não se assemelharão a “retrocessos”? E quantos retrocessos não estarão prenhes de grandes avanços?...
Então vejo a evolução como um fluido com diversas forças de variados sentidos no seu interior, cuja resultante do seu movimento depende essencialmente do posicionamento do observador!

29/1/07 11:12 da tarde  

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